A extinção da política

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A extinção da política

“Vamos extinguir a política e tudo que a ela se relacione”. Essas parecem ser as palavras de ordem de parcela significativa dos formadores de opinião e o sentimento majoritário na opinião pública brasileira, que se caracteriza pelo azedume, mau humor e profunda descrença.

Não é para menos. Em apenas quatro anos, o Brasil passou por quatro gigantescas convulsões políticas, com profundas repercussões econômicas e sociais. Primeiro, assistimos, entre incrédulos e desnorteados, a gigantesca manifestação de junho de 2013.

O que aconteceu naquele ano? Não foi apenas uma manifestação contra os R$ 0,20 de aumento na passagem de ônibus. Também não foi pela percepção de profunda incompetência do governo – naquela altura, a presidente Dilma tinha respeitáveis 55% de avaliações ótima e boa, Haddad era muito bem avaliado e Geraldo Alckmin se elegeria no primeiro turno, caso as eleições para governador fossem naquele momento. Não havia crise econômica, nem um caso espetacular de corrupção. Tudo indica que havia uma insatisfação reprimida e difusa, que explodiu sabe-se lá por que.

Depois daquelas manifestações, que também aconteceram em outras partes do mundo, o índice de confiança das instituições políticas despencou, com exceção, por motivos óbvios, do Poder Judiciário. A tabela abaixo dá uma ideia da dimensão do estrago.

Confiança nas instituições (em %)

Fonte: Ibope

 

 

 

O segundo cataclisma foi a decepção do eleitorado com a presidente Dilma Rousseff. Como se sabe, a campanha presidencial de 2014 foi muito polarizada e a então candidata petista fez questão de deixar claro que a economia não seria afetada e que o Brasil não passava por problemas. O consumo das classes populares estaria garantido e o governo não adotaria medidas de restrição fiscal, pedra de toque na campanha do tucano Aécio Neves.

Ganhando a eleição, a presidente fez o contrário do que propusera aos eleitores. Partiu para um ajuste fiscal rigoroso, seguindo o que seu adversário adotara como plataforma de campanha. A frustração foi proporcional ao engodo e os 54 milhões que votaram na petista se sentiram ludibriados.

A terceira convulsão foi o impeachment de Dilma, que dispensa maiores comentários. Para completar, a Operação Lava Jato, com a delação do “fim do mundo” da Odebrecht, a Lista de Fachin, as centenas de vídeos disponíveis na internet, a cobertura “terra arrasada” dos principais meios de comunicação, as análises neurastênicas dos assim chamados formadores de opinião, o protagonismo hiperativo do Ministério Público e por aí vai.

É compreensível, portanto, o mau humor e a descrença. Mas a generalização é muito perigosa. Bradar pelo extermínio da política e dos políticos pode ajudar a dar vazão ao nosso ódio conjuntural, mas não tem nada de construtivo. O sistema político brasileiro tem muitos defeitos e deve ser aperfeiçoado, não há dúvidas. Mas com ele fizemos uma transição sem traumas para a democracia, passamos por sete eleições presidenciais, dois “impeachments”, elaboramos uma Constituição e estamos votando as reformas.

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