

A Fundação Espaço Democrático tem realizado uma série de encontros sobre questões municipais. Dois aspectos saltam aos olhos nessas reuniões. Primeiro, a enorme responsabilidade das Prefeituras, principais responsáveis pela prestação de serviços de elevada demanda, como saúde e educação, além de realizarem ações nas áreas de transporte, coleta e destinação de lixo, segurança pública, iluminação, esporte, cultura, lazer etc.
O segundo aspecto é a absoluta penúria com a qual convivem os municípios brasileiros. O assunto é tão grave que resvala no folclore. Um prefeito de uma cidade distante, que participava de um dos debates, informou que foi obrigado a consultar seu secretário da Fazenda e verificar se poderia se deslocar até São Paulo para participar de um evento de interesse da administração de sua cidade. Valor da despesa: R$ 2 mil.
Alguns especialistas falam na “desconstrução do pacto federativo”. A escalada dessa “desconstrução” envolve uma monumental e progressiva sobrecarga de tarefas no plano municipal. A trajetória assusta. Em 1983, os municípios passaram a ser obrigados a alocar 25% dos recursos provenientes de seus impostos (ISS, IPTU, principalmente) na educação. Em 1988, essa exigência se expandiu, também, para as transferências constitucionais.
Dois anos depois, outro “presente”: as Prefeituras deveriam investir 15% do seu orçamento na área da saúde. Hoje, sabe-se que gastam muito mais do que isso. É raríssimo encontrar algum município que não tenha um nível de dispêndio acima dos 25%. E há ainda outras surpresas. Uma UPA, Unidade de Pronto Atendimento, investimento do Governo Federal, custa algo em torno de R$ 3,5 milhões para ser construída. O custo da operação, que sai dos cofres municipais, pode chegar a R$ 1,5 milhão/mês. Em dois anos de operação, os R$ 36 milhões gastos para colocar o equipamento funcionando dariam para construir nada menos do que 10 novas UPAs. Não faz qualquer sentido.
Recentemente, transferiram para as Prefeituras todo o trabalho de manutenção da iluminação pública. Também colocaram nas costas dos municípios os problemas referentes à destinação e tratamento do lixo, com a nova Lei dos Resíduos Sólidos. Ao tomar essas iniciativas, os formuladores das políticas públicas parecem desconsiderar totalmente a absoluta inexistência de recursos humanos, além de exigüidade de receitas, que caracterizam a maioria esmagadora das administrações municipais brasileiras.
Segundo o geógrafo François Bremaeker, entre 1972 e 2012 – quarenta anos, portanto -, as despesas municipais com educação e cultura saltaram de 14,82% para 26,95%, enquanto as de saúde, no mesmo período, experimentaram um impressionante salto de 5,67% para 22,91%. Isso mais uma vez comprova que os municípios, o elo mais frágil e sobrecarregado da nossa combalida estrutura federativa, vêm perdendo fôlego ao longo dos anos. Centralizar receitas e descentralizar tarefas ofende a boa lógica administrativa. Não são as Prefeituras que sofrem. É o cidadão.